Wilco – Cruel Country (2022)
Aqui está uma banda que dispensa apresentações e que há muito conquistou seu lugar no firmamento das maiores bandas da história da música americana. Mesmo que Wilco sempre tenha tido o cuidado de borrar as faixas com sublimes aventuras de aspecto experimental (Yankee Hotel Foxtrot, A Ghost Is Born), ou através da intervenção do puro e hard indie-rock (Star Wars ), a banda liderada por Jeff Tweedy sempre manteve intactas suas influências da música tradicional americana.
E não é estranho o fato de que a gênese do Wilco começou com uma das principais bandas do movimento “alt-country”(country alternativo), Uncle Tupelo; uma banda na qual Tweedy na época atuava como baixista e compositor.
Além disso, os habitantes de Chicago sempre imergiram sua música em solo americano, seja com o álbum Being There (1996) ou com a série Mermaid Avenue (1998, 2000 e 2012), produzida com o cantor e compositor britânico Billy Bragg. Sem dúvida, Wilco é de fato uma formação cujos ascendentes rochosos são totalmente assumidos.
Jeff Tweedy, John Stiratt, Glenn Kotche, Mikael Jorgensen, Pat Sansone e Nels Cline trazem-nos o Cruel Country, um álbum gravado ao vivo no estúdio caseiro da banda.
No comunicado de imprensa emitido pela gravadora dBpm, de propriedade do Wilco, Jeff Tweedy explica a direção artística tomada para este novo álbum: “Sempre houve elementos de música country no que fizemos. No entanto, nunca nos sentimos particularmente à vontade com essa forma de nos caracterizarmos, com essa ideia de que eu estava fazendo música country. Mas agora, estando aqui por um bom tempo, achamos excitante nos libertarmos dessa estrutura e abraçar o fato de que estamos fazendo country”.
O álbum é uma profunda reflexão sobre o estado das coisas na América. Na faixa-título, de forma franca e quase ingênua, Tweedy expressa esse amor e ódio que tem por sua terra natal:
“eu amo meu país
Como um garotinho
Vermelho, branco e azul
eu amo meu país
Estúpido e cruel
Vermelho, branco e azul”
– Cruel Country
Ao basear suas histórias nos mitos coletivos que sempre engrandeceram o império americano, Tweedy mergulha em si mesmo para questioná-los com sinceridade inegável. As músicas “Many worlds” e “The Universe” são testemunhas eloquentes dessa introspecção. Nessas duas peças, ele esclarece o carinho que tem por sua nação, embora agora se considere um cidadão do mundo.
Musicalmente, temos direito a uma versão country decididamente folk do sexteto que destaca as influências habituais da formação, The Byrds e Gram Parsons no topo da lista. Aqueles que amam Wilco no modo rock – que preferem quando o virtuoso guitarrista Nels Cline desenha tons abrasivos e dissonantes de seu instrumento – podem rapidamente se cansar dessas músicas aparentemente lineares. No entanto, ao longo da escuta, estes se transformam em transmissores de calafrios.
Com duração superior a 75 minutos, essa viagem à ruralidade americana é um sucesso. Em “Ambulance”, tem-se a impressão de estar à beira de um incêndio na companhia de Jeff Tweedy acompanhando-se sozinho ao violão. A fusão de piano e guitarras desarmônicas em “The Empty Condor” é pura Wilco. “Bird Without a Tail / Base of My Skull” se transforma no meio do caminho em uma espécie de country-jazz com sotaques progressivos. “Many Worlds” cheira a Reservas, a peça conclusiva do celebrado “Yankee Hotel Foxtrot” (2001), e “Story to Tell” poderia ter sido tirada diretamente de um álbum da Mermaid Avenue.
A tranquilidade dos últimos álbuns solo de Jeff Tweedy prenunciava esse apaziguamento sonoro no Wilco. Alguns vão deplorá-lo. No que nos diz respeito, Cruel Country confirma pela enésima vez que Jeff Tweedy é um dos maiores compositores americanos de sua geração.