Björk - Homogenic | Moodgate
Um novo sentimento para a música
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Björk – Homogenic

Por Joel Rocha e João Victor Mothé

“Eu poderia controlar mais, mas não quero. Sempre anseio por surpresas “, disse Björk logo após o lançamento de seu álbum de estreia em 1993. Desde os onze anos, a islandesa tinha a indústria musical como seu próprio playground: havia prestado contribuições não só a projetos modernos, como o The Sugarcubes e outros coletivos de punk gótico, mas também participado de um álbum com um trio de jazz reputado da Islândia. Debut e Post, seus dois primeiros discos solo, tinham catapultado a cantora para um status de estrelato ainda inalcançado, tornando-a globalmente famosa. Ambos os trabalhos haviam capturado a atenção de ouvintes por todo o mundo pela atitude que ia na contramão dos arquétipos tão reproduzidos na música pop.

Mesmo naquela época, Björk já havia sido reconhecida como uma das artistas mais inovadoras de seu tempo e da história da música, graças a coragem e inventividade: num mesmo disco, havia misturado uma música gravada num banheiro de um clube com técnicas e tecidos melódicos impecáveis, incluindo cordas arranjadas por Talvin Singh. Não por acaso, acumulava admiradores dentre seus colegas de indústria. Thom Yorke, do Radiohead, foi um dos primeiros a admitir a influência que a islandesa teve em seus trabalhos e, até mesmo em solo brasileiro, artistas como Milton Nascimento, Alice Caymmi e Eumir Deodato, presente na produção do segundo álbum e também no Homogenic eram e continuam sendo magnetizados pela excentricidade de Björk.

Após Post e um período de êxtase e euforia social em Londres, frequentando festas da mais diversas e conhecendo as maiores celebridades do mundo, Björk buscou refúgio em uma vila no sul da Espanha. Acreditando que sua criatividade havia sido debilitada por uma atmosfera forjada e genérica, começou a trabalhar em seu novo disco.

Em 1997, poucas semanas antes do lançamento do terceiro álbum solo da cantora, surgiram dúvidas: o título escolhido (Homogenic) anuncia um disco menos aventureiro que seus antecessores? A alma errante teria escolhido finalmente se estabilizar? Alívio imediato na primeira escuta: não, Björk não terminou de nos surpreender… Neste álbum, ao contrário, ela continua sua exploração musical e cria um novo universo onde instrumentos de cordas se incitam (a comovente “Unravel”) e os sons techno minimalistas e hipnóticos (o frio e quase inaudível “Pluto”). O resultado é uma paisagem musical de grande beleza – uma beleza gélida, estranha e flutuante.

Mais adiante, em Immature, soa como se estivesse pronta para quebrar. No disco, a cantora revela sua visão sombria das relações humanas e aborda temas e fenômenos intrinsecamente humanos, como paranoia, ilusões e desilusões. As reflexões aqui apresentadas por Björk tendem a remeter à ruptura de sua relação caótica com Goldie, do Drum and Bass, mas também à recente tentativa de homicídio promovida por um stalker obsessivo, Ricardo Lopez. Uma faixa como All Is Full of Love assume uma dimensão nitidamente irônica, mas também revitalizadora neste contexto.

Os vocais crus e ritmos abstratos de 5 Years e Immature revelam uma quantidade impressionante de raiva e dor. “Como eu poderia ser tão imaturo/ Pensar que ele iria substituir / Os elementos que faltam em mim?”, canta, na sétima faixa do Homogenic. Já na canção anterior, Björk conduz o ponto para casa: “Estou tão entediado de covardes / Que dizem que querem / Então dizem que não conseguem lidar”, antes de desafiar seu antigo parceiro: “Desafio vocês a me enfrentarem”. É na balada de guerra Bachelorette que a artista incorpora o caráter combativo e bélico da guerreira presente na capa do disco e oferece uma dimensão quase épica aos seus sentimentos, assumindo uma postura tão grandiosa que faz parecer com que o destino da humanidade depende da relação ali relatada.

Apesar do teor sentimental de faixas como Unravel e Jóga, Björk contradiz a percepção de sua audiência com sua persona prática e brutalmente honesta. “Não tenho todo esse sentimentalismo que as pessoas gostam de forçar em mim”, conta no Sonic Symbolism. “Sou muito conectada à natureza e a natureza na Islândia não é nada sentimental, mas extremamente crua. Eu queria que a música fosse muito patriota e, por isso, tentei inventar batidas que fossem tecno e vulcânicas”. Na desconcertante Pluto, com seus ritmos mecânicos e ultra-rápidos, ela pode ser visto como uma espécie de catarse, uma tentativa de externalizar as paixões.

No entanto, apesar do pessimismo radical de algumas faixas, há uma pitada de esperança em Jóga, uma faixa comovente dedicada à ilha onde nasceu e que celebra suas “paisagens emocionais”. O título é uma homenagem a uma amiga próxima da artista, Jóhanna Jóhannsdóttir, que também atuou como sua assistente pessoal durante as gravações do filme Dançando no Escuro, de Lars Von Trier, protagonizado por Björk.

Homogenic é o mais puro reflexo das ambições musicais de uma artista que, através das décadas, continua a reinventar-se para introduzir novos sons, instrumentos, técnicas e ideias em seus trabalhos. Nada de surpreendente nisso, já que, além de uma colaboração única com Mark Bell da obscura banda de techno LFO e com The Icelandic String Octet, o disco é produzido pela própria Björk. Homogenic é uma lufada de ar (gelado) no mundo musical e facilmente levará o ouvinte à uma paisagem que é, sim, emocional, mas também repleta de montanhas geladas e vulcões em atividade, aqui palco de romances épicos, confissões honestas e reflexões únicas.

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joelrneto12@gmail.com

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