A história por trás de Catch a Fire, de Bob Marley and the Wailers | Moodgate
Um novo sentimento para a música
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A história por trás de Catch a Fire, de Bob Marley and the Wailers

Reggae e seu contexto:

Com o decorrer dos anos, é comum que o passado seja visto de forma mais bela. Nos relatos fervorosos sobre o rock das décadas de 1960 e 1970, frequentemente se aborda temas como mistura cultural, amor universal e solidariedade. No entanto, em 1973 e na realidade da época, os jovens fãs de rock não tinham interesse pelo reggae como seus antecessores. A música “étnica” era considerada desinteressante, e aqueles poucos escolhidos que ouviam discos jamaicanos importados eram apelidados de “Tchaca-boom”.

Essa visão não era totalmente infundada, pois uma audição desatenta do reggae deixava apenas a impressão de um ritmo repetitivo e pulsante. O gênero, como herdeiro do ska e do rocksteady (este último mais lento), e símbolo de uma Jamaica independente desde 1962, apresenta uma estrutura rítmica completamente oposta ao rock: as batidas fortes ocorrem no segundo e quarto tempos, enquanto o terceiro é enfatizado por uma batida de caixa e bumbo. Isso, francamente, desafiava aqueles que foram criados apenas com a música anglo-saxônica durante as décadas de 1950 e 1960. Então, seria uma questão de incompatibilidade de gostos, mente fechada ou falta de afinidade com o ritmo? Você pode chamá-lo do que quiser; o resultado é o mesmo.

Catch A Fire

É evidente o impacto que nós temos em ter uma futura imprensão sobre o álbum por sua capa, e aqui é algo é notável e marcante: um grande isqueiro Zippo simplesmente decorado, com uma gravura elegante que mostra o título do álbum e o nome do grupo, The Wailers. A parte superior do isqueiro, articulada por um rebite cuidadosamente colocado, abre como o modelo original para revelar o vinil. Um toque genial. Uma peça de colecionador. E uma homenagem à chama original que dá vida à ganja. No cerimonial Rastafari, a cannabis sagrada permite entrar em contato com Jah. Ao vivo. Sem restrições, sem limites e sem barreiras.

Sabemos que o reggae foi criado por Frederick Hibbert (conhecido como “Toots”) em 1967. Assim como o blues, o reggae tem tantas origens comprovadas quanto vendedores ambulantes para comprová-las. A versão mais plausível é que o termo significaria “loquedu” (esta é a versão de Toots; Bob Marley ia tentar restaurar as origens do gênero explicando que era um termo de origem espanhola que significa “música do rei”).

São os Wailers que darão a música dos “loquedus” sua nobreza; eles o elevarão às alturas. Tanto que o estilo, pelo menos como conhecemos, não sobreviverá à morte de Bob Marley. A partir de 1981, ele desaparecerá rapidamente dos holofotes populares.

Catch A Fire é uma maravilha. Provavelmente o melhor álbum de reggae de todos os tempos; é uma epifania e não há uma única faixa que seja dispensável. O disco incorpora uma cultura, uma humanidade, uma religião, uma fé, um país e uma história, tudo isso ao mesmo tempo. Assim como o blues (mais uma vez), o reggae está enraizado na miséria e na injustiça, na terra e no colonialismo, na esperança e na revolta. Com ele, parte a ingenuidade do poeta que acredita firmemente que duas rimas simples e um refrão podem mudar o mundo. Uma piada, mas uma boa piada…

Comparado aos grandes gêneros populares da época (hard rock, jazz-rock, rock progressivo, etc.), o reggae é uma música um pouco “quebrada”. Sua estrutura (e a falta de habilidade acadêmica dos músicos) limita as variações tonais da composição. Alguns sons podem parecer confusos às vezes. Por exemplo, as passagens de teclado no álbum parecem saídas de um teclado barato do Saara do centro do Rio de Janeiro.

Mas é a intenção e o fervor que importam, e tanto as palavras quanto o fervor são excepcionais. A composição do álbum é dividida entre Bob Marley (sete faixas) e Peter Tosh (duas faixas). É difícil saber se, nessa fase de suas carreiras, os dois ainda são cúmplices ou já estão competindo entre si; ainda irmãos ou já inimigos. Seria uma questão de apenas alguns meses antes que a dupla se desintegrasse.

Portanto, é crucial aproveitar esse momento especial. Em 1973, os talentosos gêmeos brilhantes da Jamaica estão rodeados por um grupo de sonhadores: Bunny Livingston, Aston Barrett, Carlton Barrett e Robbie Shakespeare, trazendo Concrete Jungle, uma faixa de abertura surpreendente. Dizem que Aston, também conhecido como “Família” por ser um pai dedicado de quarenta filhos reconhecidos, teria contribuído para as composições de Catch A Fire sem receber nenhum crédito. No entanto, isso não é importante para ele, pois os Wailers são um coletivo onde todos trabalham em prol do bem comum. Inicialmente, essa música precisava permanecer isolada, enquanto os fãs de maconha não consideravam a ideia de se exportar, viajar ou se desconectar. Em 1973, não havia preocupações com royalties, dinheiro, contratos ou cifras. Ainda não.

É conhecido que o produtor inglês Chris Blackwell desempenhou um papel obstinado (e não necessariamente desinteressado) ao permitir que o reggae saísse da Jamaica através da Island Records. Expor-se (e depois se adaptar) nas grandes cidades da Babilônia, deixando sua alma lá, visto que todo mundo vai abusar do reggae sem a menor vergonha: Eric Clapton, The Police, UB 40, The Scorpions, Led Zeppelin, The Clash, The Rolling Stones…

O álbum enfim foi gravado em 1972 em um console de oito canais, em diversos estúdios em Kingston. Os nove títulos foram retrabalhados em Londres por Blackwell, que adicionou alguns overdubs de guitarra excêntricos e desnecessários. Enquanto Rastafáris são proibidos por Deus de cortar o cabelo, comer carne ou beber álcool, felizmente ninguém foi proibido de fazer música e gravar discos. Desde que os músicos estejam vestidos em vermelho (sangue), amarelo (riqueza) e verde (o Reino divino).

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