LVCAS – Humanamente
Após anos construindo com solidez uma carreira musical, sobretudo com os seus famosos vídeos de retrospectiva com releituras das músicas mais hypadas do ano, o multi-instrumentista Lucas Inutilismo, como é popularmente conhecido por seu canal no YouTube que atualmente conta com mais de 5 milhões de inscritos, finalmente lança seu primeiro álbum autoral.
Em entrevista concedida à Moodgate, Lucas contou como foi essa experiência de fugir da sua zona de conforto “Compor algo do zero foi a parte mais desafiadora. Porque você tá numa zona muito confortável, por mais que muitos arranjos fossem meus, eu tava ali num lugar de coisas que já existem, de coisas que eu sei que dão certo… e agora tô num lugar totalmente novo, das minhas ideias, da forma como eu enxergo a música e o mundo, uma mistura das minhas referências, então, dá um friozinho na barriga”.
Contendo 16 faixas inéditas e cada uma delas com notáveis referências que permeiam seus gostos pessoais e fizeram parte de sua história e construção enquanto músico, artisticamente falando, Humanamente é um trabalho único e particular. A começar pela produção do álbum – totalmente independente e em parceria com o produtor Marcelo Braga – em que Lucas foi responsável por gravar todos os vocais e instrumentos. Com isso, o trabalho possui uma autenticidade notória e o medo de arriscar é inexistente. Tudo é elevado, extrapolando limites, instrumentais altos, vocais altos também e que se intercalam constantemente em certas canções. O resultado é um projeto explosivo, marcante, tecnicamente impecável, mas que pode soar exagerado em alguns momentos, e isso não necessariamente deve ser apontado como algo ruim.
As duas músicas iniciais (hoje e Recomeçar) se complementam, realizando uma introdução bem conceitual com elementos do metalcore e uma base de guitarra agressiva e cadenciada, lembrando muito as músicas do Project46, uma das grandes inspirações de Lucas que, inclusive, já chegou a se apresentar em shows da banda. A letra trata, obviamente, de um recomeço, porém, mais que isso. É um grito, uma ode à libertação que se estabelece a partir de um novo ponto de partida sem deixar as marcas do que aconteceu no passado para trás, carregando consigo essa lembrança como forma de amadurecimento e não como um empecilho: “recomeçar sem todo o peso das marcas que colecionei pra aprender e poder ver o amanhã”
No Foco se destaca por sua criatividade. Na introdução, um rap mais acelerado com uma mixagem distorcida ao fundo. Soa agressivo, mas tem uma virada surpreendente ao melhor estilo Bring Me The Horizon com um screamo surpreendente. O som vai crescendo a cada minuto, característica que se faz presente no projeto como um todo, e as explosões vocais acompanhadas de riffs marcantes orquestram o ritmo. Junto a isso, elementos eletrônicos com mixagens que aparecem em momentos que o instrumental para, intercalando-se apenas com um vocal que apenas desacelera para pegar mais impulso para uma nova catarse.
É um som que parece a fusão de diversos gêneros do metal, incluindo o new metal e o metalcore, mas que carrega sua autenticidade em efetuar essa mescla demonstrando ter uma identidade própria.
Sem Controle, por sua vez, é uma das faixas mais inovadoras do álbum. Tirando um pouco do peso do instrumental, caminhando mais pro lado do pop punk, a canção demonstra um refrão mais melódico e de certa forma nostálgico, com guitarras mais agudas e uma bateria que mantém uma certa cadência. O início (“Ah não como eu fiz pra chegar aqui, já não me lembro quem eu era antes de dormir”) com rimas mais simples e uma voz bem humorada remete imediatamente ao Green Day, mais especificamente no disco Dookie.
As inspirações são muito bem aproveitadas e apesar da sensação de nostalgia por conta delas, não parece repetitivo. É algo novo e feito por alguém que gosta de música.
Te Espero Aqui é a única música do álbum que contém uma participação especial. Aqui, a voz suave de Luana Victoria acalenta corações em uma balada romântica bastante emotiva. A cantora já havia trabalhado com Lucas antes em mashup de músicas da Billie Elish, fato que faz entender tamanho entrosamento entre os dois. Essa tem tudo pra fazer parte do setlist de suas apresentações ao vivo, sendo aquele momento de respiro entre a sequência enérgica das outras músicas que a cercam. Ouvindo o álbum na íntegra, o sentimento foi esse.
Desenvolvida a partir de uma letra descontraída, com direito a barulho do whatsapp e tudo, Meu Jeitinho mostra o lado bem humorado de Lucas, tão presente em seus vídeos que o fizeram ter, acidentalmente, uma carreira de youtuber, pois como o próprio diz, ele é “um músico que virou youtuber sem querer”.
O vocal é impressionante com tons e ritmos que mudam a todo o tempo, fazem com que o próximo verso seja sempre uma incógnita, nunca se sabe o que esperar. Esse dinamismo faz com que os 3:02 minutos de canção pareçam ser sintetizados em apenas um minuto.
Odisseia já havia sido lançada como single em 2023, mas ouvindo novamente e compreendendo o álbum como algo único e sintetizado para fazer sentido, principalmente na escolha da ordem a qual as músicas nos são apresentadas, acredito que esse seja o encerramento perfeito. É o som mais alto, agressivo e potente até aqui, e olha que a briga é boa. Odisseia consegue criar uma atmosfera sombria e disruptiva.
Falando em disrupção, o final da música é surpreendente. Quando menos se espera, literalmente começa um som tecno. Virou rave. Ao seu modo, é hipnotizante. Até que o vocal melódico retorna com o instrumental pesado. O som acaba. Silêncio. Acabou mesmo? Bom, mais um screamo daqueles pra finalizar, no estilo jumpscare dos filmes de terror. Agora, sim, podemos respirar.
Nota: 8.2
LVCAS já tem show de estreia da sua carreira autoral marcado para acontecer no dia 23 de janeiro na Audio, em São Paulo. Os ingressos já estão disponíveis.