Twenty One Pilots — Clancy | Moodgate
Um novo sentimento para a música
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Twenty One Pilots — Clancy

Após quase uma década construindo uma narrativa que persuadiu, inspirou e tirou o sono de muitos fãs, Twenty One Pilots colocou um ponto final na história que envolta a cidade distópica de Dema, onde se passaram as eras Trench (2018) e Scaled And Icy (2021), álbuns compostos a partir do olhar de Clancy, eu lírico deste universo paralelo.

Anteriormente, quando não se havia o conhecimento da existência de Dema, Tyler Joseph (vocal) e Josh Dun (bateria) já haviam apresentado materiais conceituais com outros projetos. O autointitulado (2009), o Regional At Best (2011), o Vessel (2013) e, principalmente, o Blurryface (2015) já preparavam terreno para algo bem maior, visto que, até hoje, eles são usados como referência para a composição visual dos novos álbuns, bem como em traços de sua composição musical e em enigmas que a banda desenvolveu para imergir ainda mais os fãs. O Blurryface, por exemplo, apresentou, pela primeira vez, o alter ego de Tyler, que possui o mesmo nome do disco. O personagem, dessa forma, conduz o disco para representar os medos e as inseguranças do vocalista. Visualmente, ele é apresentado com as mãos, os braços e o pescoço pintados com tinta preta. Tyler também veste uma touca vermelha nas aparições dele.

Clancy, então, mais tarde, tomou frente dos álbuns adiante, com Trench e Scaled And Icy apresentando Dema e seus conflitos. Trench introduziu a cidade, explicando, através de suas letras e cartas, como funcionava o local que, por sua vez, é dividido em nove distritos, onde cada um é comandado por um bispo. Eles, no entanto, seguem o Vialismo, ideologia extremista que é baseada na autodestruição. Já os Banditos, um grupo de rebeldes comandados por Torchbearer, o Josh, se posicionam como oposição à Dema e aos bispos. Eles são apresentados durante o clipe de Jumpsuit, auxiliando o Clancy a tentar escapar de Nico, um dos bispos, e depois aparecem novamente em Nico and the Niners/Levitate, novamente auxiliando o protagonista em sua fuga de Dema e o acolhendo em um de seus acampamentos.

Em Scaled And Icy, as coisas ficam cada vez mais bizarras, porque toda a luta que ficou em aberto entre os Banditos e os bispos em Trench parecia ter sido resolvida, com as músicas animadas e felizes demais para serem verdade. Os fãs captaram, também, aparições dos bispos nos videoclipes, o que causou suspeitas de que eles haviam dominado não só Dema, como o próprio álbum. E tudo ficou ainda mais estranho quando os fãs perceberam que o nome do disco era apenas um anagrama para Clancy is dead – ou Clancy está morto. Durante esse mesmo lançamento, mais tarde, foi provado através da última carta, disponibilizada pela banda, que Clancy estava vivo. E, bom, essa revelação deu margem para uma continuação da narrativa, tanto quanto para mais teorias.

No disco, ele, como protagonista dessa história, se vê capturado e rendido aos bispos, que só o permitem criar se for para o bem da cidade de Dema, e assim eles o usam, como uma propaganda. Os bispos o forçam a performar e fazer canções promovendo a cidade como um bom lugar, e Clancy acaba se rendendo. O que ficou explícito na live stream promovida pela banda, na época do lançamento do álbum, onde os apresentadores se mostravam, fisicamente, cada vez mais estranhos, com machucados pelo rosto e olhos vermelhos – características essas parecidas com as dos bispos. Além disso, na mesma live, era reforçada a propaganda que dizia Good Day Dema, o que, com base no que foi visto anteriormente, não fazia o menor sentido, dado que naquela cidade distópica, todos os acontecimentos se distanciavam de um dia bom. Nos clipes e nas letras das músicas, também ficava evidente que Clancy foi capturado pelos bispos, isso porque ele sempre fazia menção de que estava preso em algum lugar. “Sei que acabou. Nasci um fracassado, ninguém virá me ajudar”, canta Tyler em Choker. Nessa era, também apresentado o Trash The Dragon, usado para representar um abutre em Dema. Ele aparece nos clipes de Shy Away e de Saturday.

Durante esse mesmo lançamento, mais tarde, foi provado através da última carta, disponibilizada pela banda, que Clancy estava vivo. E, bom, essa revelação deu margem para uma continuação da narrativa, tanto quanto para mais teorias. Neste ano, todas elas, desenvolvidas através de enigmas criados pelo duo, foram esclarecidas e, ocasionando pouca surpresa, elas estavam certas. Tyler deixou isso bem claro no teaser do projeto que encerraria todo esse universo, o álbum Clancy:

O disco, com 13 faixas e videoclipes para todas elas, termina toda a lore que os fãs ansiaram e decodificaram por anos. Para divulgação, o duo promoveu, por diversos países, listening partys do álbum, antes de seu lançamento. São Paulo foi escolhida para sediar a festa do Brasil. O que não é nada mais que justo, considerando que a cidade é uma das que mais escuta a banda em todo o mundo, com certa de 400 mil ouvintes, segundo o Spotify.

Assim, a história termina em Clancy, mas o legado de Twenty One Pilots não, e a Moodgate te explica o porquê! Confira:

Clancy retoma às raizes de Twenty One Pilots, mas cria nova identidade

O disco se inicia com os três singles lançados anteriormente. Overcompensate, o primeiro deles, deu largada a viagem nostálgica e eufórica que é Clancy. Em sua introdução, é cantada versos da canção Bandito, o que, também, consolida o retorno às Trincheiras. No clipe, o duo volta à Dema e Tyler, finalmente, se apresenta como Clancy aos Banditos. “Se você não consegue ver, sou o Clancy, o filho pródigo. Cansei de fugir, encontrei o Josh Dun, procurado vivo ou morto”, canta o vocalista.

Em sua sonoridade, é nítida a influência do álbum Blurryface. Com hip-hop e batidas eletrônicas, a música mantém um ritmo desenfreado, sem respiro. É uma entrada, realmente, de tirar o fôlego. Um acerto para single, considerando as referências e os ritmos nostálgicos.

Seguidamente, há Next Semester, que mostra mais do rock alternativo e o indie folk explorados no início da carreira dos pilotos. A faixa, também, é bastante acelerada, com um clipe que mostra Tyler e Josh fazendo um show, onde a plateia pula sem parar. Isso, de longe, transmite a energia da música, e deixa tudo mais intenso. No entanto, os riffs de baixo e a bateria cessam conforme a música vai chegando ao fim e, então, acordes de ukulele vão surgindo seguidos da voz, agora, mais calma de Joseph. Um bom momento para processar o mix de coisas que Clancy trouxe até esse momento. Next Semester é, acima de tudo, o anseio transmitido pela juventude quando tudo está em aberto, sem respostas. “Endireite a postura. Não pode desmoronar. Se forme”, é como a música é introduzida.

Backslide vem com mais hip-hop, mas, aqui, tudo é mais calmo e harmônico. Com batidas eletrônicas mais leves e com um vocal intenso de Tyler, o clipe, dirigido pelo próprio Josh Dun, mostra o vocalista andando de bicicleta, o que relembra o famoso clipe de Stressed Out, dado, também, o cenário dominado pela neve. Ali, Tyler canta inseguro sobre o futuro, com medo de regredir e voltar a estaca zero, o que, também, é demonstrado por takes em que ele é cercado por um ambiente escuro e neblinado, ainda andando de bicicleta.

Em complemento, há referências da banda em pôsteres de uma loja de conveniência vista no clipe que, certamente, chamam atenção, como um com o símbolo FPE, que significa The Few, the Proud and the Emotional – Os Poucos, os Orgulhosos e os Emocionais, e outro com o desenho de Jim Dun, cachorro de Josh. Além disso, Tyler entra nessa loja no começo do clipe e compra pães de hambúrguer que, por sua vez, possuem uma embalagem com a cara de Ned, criatura desenvolvida para o clipe Chlorine.

Após os singles, há Midwest Indigo, Routines In The Night e Vignette, músicas que trazem o indie, o rock alternativo e o electropop em peso. Também bastante hip-hop, as faixas se mostram, ritmicamente, contagiantes, porém, diante da melodia, elas esbanjam melancolia. Midwest Indigo fala sobre a sensação de isolamento, enquanto o eu lírico se envolve com uma pessoa, emocionalmente, fria. Routines In The Night retrata uma jornada solitária na própria mente, através de memórias e pensamentos. Vignette aborda superação, com Tyler tentando reconstruir, agora, sozinho. Ele ainda enfatiza que não se reconhece mais, tentando se recompor. “O que devo fazer a partir de agora?” repete ele, diversas vezes, buscando um propósito.

Intencionalmente, as canções se conectam, como se seguissem uma linha do tempo de sentimentos do protagonista. É uma vasta trajetória emocional, com ritmos expansivos e marcantes.

The Craving (Jenna’s Version) retorna ao folk, mas, aqui, mais calmo do que nunca. No clipe, mostram-se diversos vídeos de Tyler e, sua esposa, Jenna Joseph, junto ao vocalista cantando e tocando ukulele na frente das projeções. A música fala sobre expressar seus sentimentos quando se é uma pessoa introspectiva, bem como a preocupação que esse fator gera. “Dizer o suficiente, dizer o suficiente. Será que falei para ela, falei para ela?”, Tyler canta diversas vezes. É uma canção sincera e, até mesmo, um pouco dolorida para quem se identificar. O ritmo lento e acústico deixa tudo mais marcante.

Lavish e Snap Back navegam no hip-hop. As duas discutem sobre temas desconexos, mas se unem por Tyler se demonstrar pressionado em cada canção. Lavish, mais desgovernada e dançante, fala sobre a pressão social para se encaixar no luxo e na ostentação que muitas pessoas esbanjam. Já Snap Back, mais metódica, com ritmos eletrônicos, que lembram viagens no espaço, fala sobre se manter firme e o esforço para permanecer sóbrio. Lavish é satírica, em todos os sentidos, o que também fica explícito no clipe, com Tyler e Josh de terno em uma limousine. Já Snap Back é introspectiva, como o próprio Tyler se define na composição.

Navigating entrega uma grande volta sonora entre o rock, o indie e o electropop, sem parar. A faixa é mais um retrato da mente de Tyler, mas se mostra ousada e perversa, devido às batidas exacerbadas. Acima de tudo, ela é profunda e sombria, discorrendo acerca dos labirintos da mente, mais precisamente, do vocalista, quando enfrenta a ansiedade e os medos dele. Além disso, em seu videoclipe aparecem Banditos e há referências e as batidas iniciais da música My Blood, do álbum Trench.

Oldies Station é uma jornada folk e eletrônica, que aborda sobre depressão e saúde mental. É uma canção leve como uma viagem em uma estrada limpa e vazia, enquanto fala sobre desafios diários da vida, batalhas individuais e o medo do futuro, porém de forma otimista. “Quando a escuridão recair sobre você, siga em frente”, canta Tyler no refrão.

At The Risk of The Feeling Dumb e Paladin Strait finalizam o álbum de maneira improvável, com uma faixa animada e uma reflexiva, respectivamente. At The Risk of The Feeling Dumb tem riffs de baixo, batidas eletrônicas explosivas e alegres, e uma bateria frenética. É uma das músicas mais marcantes do disco, propensa para ser uma das favoritas, que também coloca a saúde mental como tema, mais especificamente explicando a importância de cuidar e zelar por amigos em momentos difíceis.

Paladin Strait tem um ritmo reconfortante em meio ao caos, com o folk bem traçado. Com ukulele e batidas estáticas que remetem a uma floresta num piscar de olhos, a música acalma. Isso seria ainda mais relaxante se não fosse a letra, que transporta o ouvinte para uma narrativa de confronto e fuga dentro de Dema. Com Clancy como protagonista, ele relata sobre sua incessante luta por deixar a cidade, bem como suas inseguranças. É uma canção para o conhecer. Um fechamento intenso, simbólico e dolorido.

Twenty One Pilots, assim, prova que, além de produzir músicas sonoramente intimistas, felizes e efervescentes, demonstra preocupação com temas importantes como a saúde mental e futuro da sociedade. E isso, ainda, é introduzido em universo criado pelo duo, que, destópico, também está longe da perfeição. Tais dimensões, por sua vez, são usadas como ponte para mostrar o pensamento de Tyler e Josh sobre problemas atuais, principalmente voltados para os conflitos internos das pessoas. Dema e seu universo se mostram como uma narrativa admirável com essas metáforas instigantes à realidade e com o desenvolvimento da história da cidade, que provoca e move fãs para além dos ritmos. Acima de tudo, Clancy é um álbum sincero e versátil, que reitera que os pilotos possuem um legado para além da distopia.

Nota: 8.6

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