A versatilidade irrefreável do Big Thief, uma das bandas mais empolgantes do indie | Moodgate
Um novo sentimento para a música
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A versatilidade irrefreável do Big Thief, uma das bandas mais empolgantes do indie

Apesar da sonoridade que em muito se ancora no folk rock, Big Thief explora todas as possibilidades de uma paleta musical grandiosa através de composições francas, mas não menos majestosas. Como nenhuma outra voz no nicho, o timbre vulnerável e frágil de Adrianne Lenker, vocalista da banda, pincela as mais diversas histórias fabricadas com a banda com cores por vezes vibrantes, mas não raramente opacas, melancólicas e intensamente relatáveis. Formado em 2015, o coletivo novaiorquino de quatro membros figura entre as indicações nas categorias alternativas do 65° Grammy Awards graças ao sucesso de crítica do espetacular Dragon New Warm Mountain, I Believe In You, lançado no primeiro bimestre de 2023. Foi, no entanto, o rock etéreo de Masterpiece, de 2016, que primeiro introduziu o quarteto para a audiência indie, em parte impulsionada pelas críticas positivas de publicações musicais mas, para além disso, pelo próprio mérito do álbum, um disco de estreia capaz de exibir todo o potencial lírico, arranjo e versatilidade da banda.

Masterpiece é uma coletânea de memórias agridoces que, na tracklist, recebem nomes próprios. Dentre Lorraine, Randy e Paul, a produção navega entre extremos de quietude e energia para, ocasionalmente, oferecer meios termos igualmente aprazíveis. Antecedida pela cálida e breve Little Arrow, a faixa título exibe tal contraposição já em seus primeiros acordes, dedicados a um antigo relacionamento do qual o eu lírico parece pretender, finalmente, distanciar-se. A fábula romântica e repleta de culpa de Paul é, em Masterpiece, a peça central do disco e encarrega-se de expressar a capacidade ímpar de Lenker em embalar faixas sentimentalmente nostálgicas que carecem de qualquer defesa. A música é uma ode empática às próprias imperfeições, aqui reconhecidas como um empecilho que, racionalmente, inibem qualquer possibilidade de relacionamento com alguém gentil. ”Na última vez em que vi Paul, fui horrível e quase o deixei entrar”, canta uma debilitante Lenker, em primeiros versos que anunciam a sinceridade visceral da faixa. A protagonista de Paul vai na contramão dos clichês líricos em culpabilizar o outro por uma relação infrutífera, assumindo-se responsável e consciente o suficiente para negar a aproximação de seu amado.

A produção do primeiro disco conta com James Krievchnia, engenheiro sonoro que, após a confecção do álbum, tornou-se integrante permanente do Big Thief, exercendo a função de bateirista. É precisamente a confluência criativa de Krievchnia com os outros três membros, Buck Meek,** Max Oleartchik** e a frontwoman Adrianne Lenker, que sustenta a variabilidade impecável no catálogo do grupo. Seja quando estão entoando as notas do indie rock (Shark Smile, Little Things) tão característico da banda ou quando recorrem à números de guitarra e percussão mais explosivos (Not), o coletivo convence pela aptidão em tornar qualquer melodia ou gênero parte do ecossistema sonoro do Big Thief. Especialmente desde Two Hands, o álbum de 2019, o grupo surpreende pela confiança com a qual se aproximam de zonas ainda inexploradas, culminando no uso de sons mais sintéticos e eletrônicos para a elaboração do último lançamento, com suas vinte músicas inéditas.

Dragon New Warm Mountain, I Believe In You é o trabalho mais denso e ousado da banda, que não permitiu que o recente sucesso na cena indie lhes impusesse freios. É um compêndio de faixas majestosamente ambiciosas que viajam entre sons já conhecidos à audiência do Big Thief e performances mais corajosas, embora não necessariamente distantes de suas raízes folk. O senso de humor presente nas cordas explicitamente country de Spud Infinity, a terceira faixa, surge na sucessão de duas canções de composição sensível, alicerçadas em instrumentais mais plácidos. Change inicia o álbum com uma meditação inquietante acerca da mobilidade da própria existência, aqui exemplificada na eminência de uma nova relação por parte de um antigo amor.

Similarmente, o misticismo da música que intitula o álbum transporta o ouvinte a um refúgio pacífico com seus símbolos fantasiosos e produção que remonta, em parte, os trabalhos solo de Lenker. songs, o tímido e encantador disco da vocalista lançado em 2020, apareceu consistentemente em diversas listas de melhores álbuns de 2020, como da Pitchfork e NPR.

Para os amantes do Big Thief, são as performances ao vivo que se encarregam de, definitivamente, tornar qualquer ouvinte casual em fã imediato. A energia e imensa personalidade exibida por cada membro durante os concertos contribui para a projeção de atos verdadeiramente envolventes e visceralmente divertidos. Numa era em que o apreço pela pristinidade e técnica vocal torna-se objeto de debate nas redes sociais sempre que algum grande nome comete erros, há algo de refrescante em testemunhar Lenker atribuir um tom gutural à sua voz, tão cultuada entre os entusiastas por sua potência quase esotérica de tão frágil. Tal irreverência, no entanto, aparece em outros momentos mesmo nas produções de estúdio da banda, como na faixa UFOF, do disco de mesmo nome, que examina a possibilidade de não só aceitar, mas abraçar completamente o desconhecido. Como alegoria, escolhem referir-se a um amigo extraterrestre que navega dentro de um objeto voador não identificado.

Indicados ao Grammy de Melhor Álbum Alternativo por Dragon New Warm Mountain, I Believe In You e Melhor Performance de Música Alternativa com Certainty, Big Thief coleciona admiradores e chama a atenção como uma das bandas mais engenhosas e cativantes do indie estadunidense. Enquanto o último álbum trouxe ainda mais projeção para uma carreira já meteórica, é impossível contestar a habilidade singular do quarteto em enfeitiçar seus ouvintes com a poesia lírica manifesta por um dos timbres mais intrigantes da indústria e, sobretudo, a própria impermanência. Tanto quanto as próprias composições, que não raramente usam de pronomes diferentes e imprecisos para referir-se às figuras mitológicas nas letras, o coletivo recusa-se a manter-se à sombra da segurança.

Tamanha versatilidade se encontra melhor estampada nos contrastes palatáveis do último álbum, ora country (Red Moon), ora *trip hop *(Blurred View). Mesmo em suas frações mais delicadas oferecidas pela serenidade de voz e violão, o disco é imediatamente bem sucedido em seduzir pela sensibilidade com a qual aproxima-se de suas reflexões corriqueiras sobre o tempo, a efemeridade ou a efervescência do amor e do erotismo.

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