Os 10 melhores álbuns de 2023
Por mais subjetiva que a apreciação da arte possa ser, é inegável o potencial que alguns projetos apresentam em provocar impressões duradouras, surpreender pela inovação e autenticidade ou simplesmente proporcionar imenso entretenimento. Ao longo do último ano, diversos bons discos cumpriram o propósito de alavancar carreiras de artistas em acensão, como Amaarae e a banda Wednesday; outros, no entanto, sustentaram os elevados padrões de qualidade tradicionais de intérpretes como Kelela e Caroline Polachek. Estréias como as de Blondshell e Kara Jackson impressionaram, enquanto a volta dos Stones deixou a desejar. Sobretudo, seria impensável não mencionar os diversos bons trabalhos de artistas nacionais, como Mateus Fazeno Rock, Ana Frango Elétrico e Jaloo, além do inspirador último projeto de Marcelo D2.
Mesmo assim, é impossível não desenvolver um apreço especial por um disco ou outro. Na lista da Moodgate dos dez melhores álbuns de 2023, são elegíveis os LPs inéditos lançados entre 1 de janeiro e 29 de dezembro e que também já tenham sido formalmente avaliados pela revista, seja no formato compacto das listas mensais ou nos reviews individuais. Além de considerar as notas atribuídas na ocasião da resenha, o ranking ainda tem em mente a apreciação geral da equipe.
10. Jards Macalé: Coração Bifurcado
samba; mpb — 28 de abril
Longos são os anos em que Jards Macalé está em atividade, afinal, seu primeiro disco autointitulado aterrissou na cultura brasileira em 1972. Desde então, o compositor, violinista e exímio cantor fez consideráveis contribuições à música nacional sem titubear ou deixar esvanecer seu potencial criativo, como visto em Besta Fera, de 2019, e em seu último disco, Coração Bifurcado. Em Coração Bifurcado, Macalé narra a relação de um eu-lírico — quiçá inúmeros — com o amor. Não da maneira que o mainstream e sua frequente ode literal à sofrência o fazem, mas compreendendo os heroísmos e vilanismos desse sentimento com irretocável atenção à musicalidade e sensibilidade. O disco, que é perfeitamente sintetizado em verso de Amor In Natura (“o amor está de olho no botão da sua blusa, ele usa e abusa dessa força delicada, quase bruta”), conta com direção artística de Romulo Fróes, que divide os créditos com Macalé desde Besta Fera, e vozes como a de Bethânia e Ozzetti, que brilham, respectivamente, em Mistérios do Nosso Amor e Simples Assim, que são duas das faixas de grande destaque neste disco que nos lembra que, embora o simplório e popularesco estejam em voga, há caminhos para manter-se popular sem abrir mão do zelo. — Victor Rufino
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9. Boygenius: the record
indie rock; indie folk — 31 de março
Em outubro, nos comentários de um tweet que previa a vitória do Boygenius contra Lana Del Rey em uma categoria do Grammy, nascia um viral: “medo desse Boygenius levar, até porque são homens”, declarou um internauta preocupado. Apesar da repercussão sarcástica imediata, a postagem cumpre o exato propósito pretendido por Lucy Dacus, Phoebe Bridgers e Julien Baker ao arquitetar a super-banda Boygenius em 2018: o de satirizar o arquétipo do rockstar masculino, referenciado como um gênio pela imprensa e pelo público sem necessariamente empreender muito esforço para isso. O trio estadunidense, do contrário, ganha louros pela química invejável, a postura irreverente e a forma como, embora levem a música extremamente a sério, sempre parecem estar se divertindo. Como sucessor do EP autointitulado, o álbum the record compila as influências particulares de cada uma das integrantes e, em meio a canções de indie rock poderosas e baladas melancólicas, convence pela dinâmica vocal harmoniosa de Lucy, Phoebe e Julien. — Helena Sbrissia
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8. Ana Frango Elétrico: Me Chama De Gato Que Eu Sou Sua
bossa nova; funk; jazz; pop alternativo — 20 de outubro
Não é por acaso que Ana Frango Elétrico é a artista brasileira com maior projeção na crítica internacional: Me Chama De Gato Que Eu Sou Sua é um sopro de jovialidade de gêneros ainda pouco abraçados pelas audiências mais jovens. Ana é uma artista que rompe a barreira da sonoridade padrão nacional e nada na direção contrária do mainstream para entregar um trabalho impecável e relevante. Com doses pulsantes de funk e jazz, é difícil não se deslumbrar com os arranjos estonteantes e as batidas carismáticas do último disco da carioca, que é, bem como seus projetos anteriores, muito beneficiado pelo carisma e pela voz doce da artista. Com seletas letras cômicas que lembra o humor da banda CSS, Me Chama de Gato Que Eu Sou Sua projeta um ambiente colorido e divertido que mostra com intensidade a brasilidade em seus detalhes, elevando e renovando gêneros musicais como bossa nova, samba e funk. — Caio Bandeira
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7. Caroline Polachek: Desire, I Want to Turn Into You
pop alternativo; art pop — 14 de fevereiro
Com um lançamento à indústria musical muito bem abraçado pela crítica, o disco Pang, a cantora Caroline Polachek tornou-se um símbolo expressivo da música alternativa contemporânea. Suas faixas que flertam com o experimentalismo eletrônico e algumas composições minuciosamente interligadas e coesas são o suficiente para colocá-la em evidência na indústria fonográfica e, no Desire, I Want To Turn Into You, a cantora, compositora e produtora estadunidense explora sua própria natureza de uma forma ousada e atípica, por intermédio do uso harmônico e potente de sintetizadores e de efeitos nos seus registros vocais. Caroline comanda o arquipélago pintado pelo disco como uma esfinge que, ao invés de ameaçar seus convidados com enigmas complexos, os desafia a deixá-la, ciente de que, a cada nova faixa, a vontade de permanecer aumenta. Entre músicas como I Believe, dedicada à finada SOPHIE, e a explosiva abertura com Welcome to My Island, Polachek é figurinha carimbada em qualquer discussão sobre o pop alternativo graças ao seu vanguardismo e pré-disposição a experimentar, sem necessariamente soar ou inacessível. — Marcella Fronterota
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6. Kelela: Raven
r&b alternativo; ambiente — 10 de fevereiro
Enquanto grandes lançamentos da década se inspiram na animosidade da disco music, Kelela surgiu com uma proposta mais sutil, elegante e diversa, com músicas que se adequam tanto a um quarto escuro quanto a uma pista de dança. Em seu regresso após oito anos do Take Me Apart, seu disco anterior, a cantora mostra talento de sobra em produções criativas que proporcionam a impressão de mergulhar em um clube noturno subterrâneo exclusivo. Raven, ao longo de uma hora de duração, tem uma cadência impecável e fluida entre as faixas, com contrastes sonoros que demonstram o amadurecimento emocional da artista através do ritmo expansivo, contagiante e sensual. Em Raven, não é só a segurança de Kelela ou suas boas ideias que impressionam: o direcionamento é irretocável, assertivo e se responsabiliza por criar uma experiência sonora coesa, permitindo que nenhuma canção soe fora de tom. O resultado não é por acaso, já que, na ocasião em que começou a produzir o álbum, Kelela enviou uma série de referências literárias, musicais, cinematográficas e filosóficas aos seus potenciais colaboradores, exigindo que, caso quisessem trabalhar com ela, teriam que fazer o dever de casa. — Marcella Fronterota
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5. Depeche Mode: Memento Mori
synth pop — 24 de março
O décimo quinto álbum da carreira do Depeche Mode quase soa como algo que poderia ter sido lançado entre o fim da década 80 e a primeira metade dos anos 90, e dizer isso sobre um disco do Depeche Mode após 40 anos de existência é, definitivamente, o maior dos elogios. Apesar de alguns notáveis tropeços em discos anteriores, Memento Mori mostra que a criatividade de Dave Gahan e Martin Gore é, mesmo na ausência dos demais integrantes, o suficiente para sustentar o legado da banda com maestria. No último projeto, à luz do falecimento de Andrew Fletcher, membro fundador do Mode, as batidas sombrias de synthpop que caracterizam o grupo ganham novas expressões e significados. Não é a tragédia que faz de Memento Mori o melhor lançamento da banda nas últimas duas décadas, mas sim o fôlego e a inspiração impecavelmente preservadas por Gore e Gahan mesmo depois de quatro décadas. — João Victor Mothé
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4. Sufjan Stevens — Javellin
indie folk; cantor/compositor — 6 de outubro
Na delicada Shit Talk, um dos destaques do Javellin, Sufjan Stevens propõe ao seu parceiro que se distanciem dos conflitos de ego e orgulho para que possam preservar o que ainda resta de paixão, respeito e outros inestimáveis sentimentos entre os dois. Frases como “no futuro haverão terríveis consequências para tudo o que deixamos incompleto” e “eu sempre te amarei, mas não consigo viver com você” não só soam terrivelmente terminais, mas também atravessam com eficiência qualquer pessoa que já tenha vivido um amor difícil. A bem da verdade, nenhum relacionamento é fácil: se entregar com intensidade e comprometimento à alguém e aos inúmeros bons momentos juntos significa, também, estar preparado para perdê-lo. Essa duplicidade é uma das inúmeras belezas do último disco do veterano do folk estadunidense que, ao longo de 2023, batalhou contra algumas das mais cruéis fatalidades da existência humana. A doença, a morte, o luto e o amor são lamentados e celebrados em proporções similares num projeto sensível e magnificamente orquestrado, contendo algumas das faixas mais emotivas da carreira de Sufjan desde o fúnebre Carrie & Lowell, como a insegura e comovente So You Are Tired e a esperançosa Will Anybody Ever Love Me?. — João Victor Mothé
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3. Marcelo D2: Iboru
hip hop; samba — 14 de junho
Em 2023, Marcelo D2 celebrou seus 30 anos de carreira mostrando que é capaz de inovar, e muito, num projeto que mescla o samba, o terreiro e o melhor que a brasilidade pode oferecer. Iboru mostra como é importante contemplar o passado para mergulhar em uma ancestralidade comum a todo povo brasileiro, com requintes de uma riqueza cultural tão vasta que é capaz de inebriar os sentidos de qualquer apreciador de boa música. D2 transita entre cenários cotidianos, da gira ao churrasquinho de domingo, da cerveja ao cafézinho, e mostra que sabe misturar o rap com o samba em uma combinação tão perfeita quanto feijão com arroz. — Helena Sbrissia
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2. Lana Del Rey: Did you know that there’s a tunnel under Ocean Blvd?
pop alternativo; cantor/compositor — 24 de março
Desde o triunfal Norman Fucking Rockwell!, de 2018, Lana Del Rey embarcou, ao lado do produtor Jack Antonoff, numa jornada dedicada a lançar alguns de seus projetos menos palatáveis para o público geral. Distantes do arquétipo da popstar melancólica e misteriosa emulado e conservado pela artista desde sua estréia em 2012, os dois discos que antecederam o Did you know that there’s a tunnel under Ocean Blvd? aproveitaram-se da despretensão para fornecer espaço aos traumas, reflexões e desejos de Elizabeth Woolridge Grant, o nome por trás de Lana Del Rey. Felizmente, no magnífico Ocean Blvd, é Grant que, mais uma vez, toma a frente, mas agora alicerçada por produções deslumbrantes e as composições mais vulneráveis e bem escritas de sua carreira até agora. Imersa em meditações acerca da natureza efêmera da vida e de seu passado conturbado, a maior lição deixada pelo nono álbum de estúdio da artista é que, a despeito das acusações acerca de suas origens ou imagem fabricada, Elizabeth Grant é muito mais interessante do que Lana Del Rey. — Victor Rufino
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1. Amaarae: Fountain Baby
afrobeats; r&b alternativo
No segundo álbum de sua carreira, Amaarae mostra uma habilidade fora do comum para transitar entre gêneros, momentos e influências, mas não é só a versatilidade do Fountain Baby que o consagra como o melhor disco de 2023 para a Moodgate: a ganesa americana propõe ao ouvinte um entretenimento de ponta em um álbum absolutamente memorável, fugindo do óbvio em diversos aspectos e, simultaneamente, mostrando-se um clássico instantâneo de todos os gêneros que alcança. Como a cereja do bolo, a voz etérea e inebriante da cantora elucida letras pomposas, instigantes e sensuais, dotadas de letras perspicazes e misturar de harpas, violinos, tambores africanos e até mesmo folk japonês. — Helena Sbrissia
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